APORTE
Forneço subsídios ao silêncio,
Não o medo, mas a perplexidade,
Essa cama que flutua entre as
auroras.
Mas não entendo teu mutismo,
O crepúsculo no teu palato
Quando fechas a boca, o vácuo,
Ausência parcial de sensibilidade
da língua:
Perdeu-se o gosto das palavras,
O salino, o adocicado, o cítrico,
o amargo.
No entanto, comunicamos,
A pele é que é impelida
A trair a ruptura do verbo (nervo
crítico),
E o corpo captura o desejo
omitido:
Mal o teu púbis se insinua, aflito
Algo em mim se levanta, grua,
Então se enraíza um diálogo acima
do silêncio
E, no mais, temos dito.
LUMINOSA
Anoitece,
e tal como suponho aconteça
na vida pessoal,
os planos distantes
são os primeiros a desaparecer
até a resistente nitidez
do foco central
onde se finca a aguda pata
do compasso existencial,
e tal como suponho aconteça
na vida pessoal,
os planos distantes
são os primeiros a desaparecer
até a resistente nitidez
do foco central
onde se finca a aguda pata
do compasso existencial,
e a circunferência das sombras
se retrai,
até o ponto onde se grita:
luz! Mais luz!
A sobrecarga impossível,
antes da queima do circuito
e da escuridão total.
SISTEMA NERVOSO AUTÔNOMO
Ao ouvir o som do meu coração
Sinto-me especialista em criptografia,
Intruso, espião em território estrangeiro,
País governado ditatorialmente
Pela vida.
Sinto-me especialista em criptografia,
Intruso, espião em território estrangeiro,
País governado ditatorialmente
Pela vida.
CRÔNICA
Um velhinho passa
sob a minha janela,
camisa surrada,
calça jeans, sandálias
e boné.
sob a minha janela,
camisa surrada,
calça jeans, sandálias
e boné.
Claudica.
E me enterneço,
como preconceito
de que está cansado
de levar sua história
anônima, banal
e pesada,
a pé.
e pesada,
a pé.